Gênesis 3:13


O Senhor Deus perguntou então à mulher: "Que foi que você fez? " Respondeu a mulher: "A serpente me enganou, e eu comi".
 

1. Introdução

Este versículo continua o interrogatório divino no Jardim do Éden, agora direcionado a Eva após Adão ter tentado transferir a culpa para ela. A resposta de Eva revela um padrão semelhante ao de Adão, mas com nuances importantes que aprofundam nossa compreensão sobre a natureza humana caída e as dinâmicas da tentação.

A importância deste versículo reside em seu papel como continuação da cadeia de responsabilidade. Após Adão culpar Eva (e implicitamente Deus), agora Eva tem oportunidade de responder. Sua resposta demonstra que a tendência de transferir culpa não é exclusiva de Adão, mas característica universal da humanidade caída. No entanto, diferentemente de Adão que culpou outra pessoa, Eva culpa a serpente - introduzindo pela primeira vez no diálogo a presença do enganador.

O contexto imediato revela a progressão do interrogatório divino. Deus primeiro confrontou Adão, que culpou Eva. Agora Deus se volta diretamente para Eva, dando-lhe oportunidade de assumir responsabilidade. A pergunta de Deus - "Que foi que você fez?" - ecoa a pergunta feita a Adão, estabelecendo padrão de confronto pessoal e individual que não permite esconder-se atrás de outros.

A estrutura da resposta de Eva é reveladora. Como Adão, ela não começa com confissão direta, mas com explicação que aponta para fonte externa de sua ação: "A serpente me enganou." Apenas depois desta explicação vem a admissão: "e eu comi." Esta estrutura revela que, mesmo reconhecendo ter sido enganada, Eva está consciente de sua própria escolha e ação.

A introdução da serpente no diálogo é crucial. Até este momento, no interrogatório, Deus havia falado apenas com Adão e Eva. A menção da serpente por Eva agora traz à tona o terceiro participante nesta tragédia, preparando o terreno para o julgamento que virá. A serpente, que havia iniciado todo o processo de tentação, agora é explicitamente identificada como enganadora.

A palavra "enganou" é particularmente significativa. Eva não apenas diz que a serpente lhe ofereceu o fruto ou a influenciou, mas que foi enganada. Isto reconhece que houve elemento de falsidade e manipulação, não apenas persuasão. Eva percebe que foi vítima de mentiras, embora isto não a isente de responsabilidade por ter escolhido acreditar nessas mentiras em vez de confiar na palavra de Deus.

Este versículo também estabelece tema bíblico importante: a realidade do engano espiritual e da guerra espiritual. Não estamos lutando apenas contra nossas próprias inclinações pecaminosas, mas contra forças espirituais que ativamente buscam nos enganar e nos afastar de Deus. Reconhecer isto é crucial para vigilância espiritual.


2. Contexto Histórico e Cultural

O interrogatório divino no Jardim do Éden segue padrão reconhecível nas culturas legais do Antigo Oriente Médio. Autoridades questionavam indivíduos sequencialmente, permitindo que cada um apresentasse sua versão dos eventos. No entanto, diferentemente de sistemas judiciais humanos onde juízes podem ser enganados, Deus já conhece toda a verdade e questiona para proporcionar oportunidade de confissão.

A referência à serpente traz dimensões culturais interessantes. No mundo antigo, serpentes eram frequentemente associadas com sabedoria, mas também com perigo e traição. Em algumas culturas do Oriente Médio, serpentes eram símbolos de divindades ou forças espirituais. O uso de uma serpente como agente de tentação seria imediatamente reconhecido como algo sinistro e sobrenatural.

O conceito de engano tinha peso significativo nas culturas antigas. Códigos legais como o de Hamurabi incluíam penalidades severas para fraude e engano. Ser enganado não era visto como desculpa completa para ações erradas, mas era reconhecido como fator atenuante. Eva, ao mencionar o engano, está parcialmente reconhecendo sua vulnerabilidade, mas não negando sua ação.

A posição da mulher nas culturas do Antigo Oriente Médio variava, mas geralmente havia estruturas patriarcais onde homens eram vistos como líderes e responsáveis principais. Neste contexto, o fato de Deus questionar Eva diretamente é significativo - Ele trata Eva como agente moral responsável, não apenas como extensão de Adão. Cada pessoa deve prestar contas individualmente perante Deus.

A prática de diálogo direto entre divindade e humanos era tema comum em literaturas antigas, mas a natureza deste diálogo é única. Diferentemente de narrativas onde deuses são caprichosos ou arbitrários, aqui Deus é justo, dando oportunidade igual para cada pessoa explicar suas ações antes de pronunciar julgamento.

O conceito de tentação através de engano também tinha paralelos em outras literaturas antigas, onde heróis ou heroínas eram testados através de enganos ou ilusões. No entanto, a narrativa de Gênesis difere por sua honestidade brutal sobre as consequências e por não romantizar a transgressão.


3. Análise Teológica do Versículo

O Senhor Deus perguntou então à mulher

Esta frase introduz o envolvimento direto de Deus nas consequências da Queda. O uso de "Senhor Deus" enfatiza o relacionamento de aliança entre Deus e a humanidade. No contexto de Gênesis, Deus é retratado tanto como Criador quanto como Juiz. O direcionamento direto à mulher destaca seu papel na narrativa e o engajamento pessoal de Deus com cada indivíduo envolvido na transgressão.

"Que foi que você fez?"

Esta pergunta não é para informação de Deus, mas serve como meio para a mulher reconhecer suas ações. Ecoa a pergunta anterior de Deus a Adão, enfatizando responsabilidade pessoal. A pergunta é reminiscente da investigação de Deus a Caim em Gênesis 4:10: "Que fizeste?" Sublinha a seriedade do pecado e a necessidade de confissão e responsabilização.

"A serpente me enganou", ela respondeu

A resposta da mulher aponta para o papel da serpente no engano. Isto reflete o tema da tentação e a natureza astuta da serpente, que é mais tarde identificada como Satanás em Apocalipse 12:9. O ato de engano é central à narrativa, ilustrando a introdução do pecado no mundo através de mentiras e manipulação. Isto também se conecta a 2 Coríntios 11:3, onde Paulo adverte sobre ser desviado como Eva foi.

"E eu comi"

A admissão "e eu comi" é um reconhecimento direto de sua desobediência. Comer o fruto proibido representa o ato de pecado, que trouxe morte espiritual e separação de Deus. Este ato é crucial na narrativa bíblica, pois prepara o cenário para a necessidade de redenção e a eventual vinda de Jesus Cristo, o "segundo Adão" (1 Coríntios 15:45), que restauraria o que foi perdido através de Sua obediência e sacrifício.


4. Pessoas, Lugares e Eventos

1. O Senhor Deus

O Criador, que é onisciente e onipotente, questionando Eva para levá-la a uma compreensão de suas ações.

2. A Mulher (Eva)

A primeira mulher, criada por Deus, que foi enganada pela serpente e comeu o fruto proibido.

3. A Serpente

Uma criatura usada por Satanás para enganar Eva, representando astúcia e engano.

4. O Jardim do Éden

O lugar perfeito criado por Deus para Adão e Eva, onde ocorreu a queda do homem.

5. O Engano e a Queda

O evento onde Eva foi enganada pela serpente, levando à desobediência do mandamento de Deus e à subsequente queda da humanidade.


5. Pontos de Ensino

A Natureza do Engano

O engano frequentemente começa com questionar a palavra e intenções de Deus. Devemos ser vigilantes e fundamentados nas Escrituras para reconhecer e resistir ao engano.

Responsabilidade Pessoal

Embora Eva tenha sido enganada, ela ainda tinha responsabilidade por suas ações. Devemos reconhecer nossas próprias escolhas e suas consequências, em vez de transferir culpa.

A Importância da Obediência

Desobediência aos mandamentos de Deus leva à separação Dele. A obediência é crucial para manter um relacionamento correto com Deus.

O Papel da Confissão

A pergunta de Deus a Eva foi uma oportunidade para confissão. Devemos ser rápidos em confessar nossos pecados e buscar o perdão de Deus.

As Consequências do Pecado

O pecado tem consequências de longo alcance, afetando não apenas o indivíduo, mas também a comunidade mais ampla e a criação. Compreender isto pode nos motivar a buscar justiça.


6. Aspectos Filosóficos

Este versículo levanta questões filosóficas profundas sobre responsabilidade moral em contexto de engano, a natureza do livre-arbítrio quando influenciado por informações falsas, e a relação entre ser vítima e ser agente moral responsável.

A filosofia moral há muito debate sobre culpabilidade quando há engano envolvido. Se alguém age baseado em crenças falsas deliberadamente plantadas por outro, quão responsável é pela ação? A resposta de Eva - reconhecendo tanto o engano quanto sua própria ação - sugere que engano atenua mas não elimina responsabilidade.

Do ponto de vista epistemológico, este versículo explora como conhecemos a verdade e como distinguimos entre verdade e mentira. Eva havia recebido palavra direta de Deus, mas escolheu acreditar nas palavras da serpente que contradiziam o mandamento divino. Isto ilustra que conhecimento da verdade não é suficiente; deve ser acompanhado por compromisso de confiar nessa verdade mesmo quando desafiada.

A dimensão ontológica do engano também é significativa. A serpente não apenas deu informação falsa, mas prometeu transformação ontológica - "sereis como Deus." O engano mais profundo não é sobre fatos superficiais, mas sobre a natureza da realidade e identidade. Eva foi enganada sobre quem ela poderia se tornar e o que constitui verdadeira realização humana.

A filosofia da ação examina distinção entre atos voluntários e involuntários. Aristóteles argumentava que ações feitas sob ignorância podem ser involuntárias se a pessoa não teria agido se conhecesse a verdade. No entanto, se a ignorância é resultado de negligência própria, a pessoa ainda é responsável. Eva tinha conhecimento do mandamento de Deus mas escolheu duvidar dele, tornando sua ignorância parcialmente auto-infligida.

A questão da agência moral em contexto de influência espiritual maligna também surge. Se forças sobrenaturais estão trabalhando para nos enganar, quão livres são realmente nossas escolhas? A resposta bíblica parece ser que, embora enfrentemos influências espirituais reais, mantemos capacidade de escolha e responsabilidade por essas escolhas.

Do ponto de vista ético, este versículo estabelece que ser enganado não nos torna meramente vítimas sem agência. Eva foi simultaneamente enganada pela serpente E escolheu comer o fruto. Estas duas realidades coexistem. Na vida moral, frequentemente somos tanto influenciados por forças externas quanto responsáveis por nossas respostas a essas influências.

A filosofia da linguagem também oferece insights. O engano da serpente funcionou através de ambiguidade linguística e questões que plantaram dúvida. Isto ilustra poder da linguagem não apenas para comunicar informação, mas para moldar percepção e influenciar escolhas. Vigilância sobre como linguagem é usada para nos influenciar é crucial para resistir engano.


7. Aplicações Práticas

Em Situações de Manipulação Relacional

Quando você percebe que foi manipulado ou enganado em relacionamento, reconheça tanto a manipulação quanto sua própria escolha de resposta. Dizer "Fulano me manipulou" é verdade, mas não conta toda história. Também pergunte: "Por que escolhi acreditar? Que sinais ignorei? Como posso desenvolver melhor discernimento?" Responsabilidade madura reconhece influências externas sem usar-las como desculpa completa.

Com Informações Falsas e "Fake News"

Na era digital, somos constantemente bombardeados com informações falsas projetadas para nos enganar. Quando você compartilha notícia falsa ou age baseado em desinformação, assumir responsabilidade significa dizer: "Fui enganado por esta fonte, MAS também falhei em verificar antes de compartilhar/agir." Desenvolva hábito de verificar informações, especialmente quando confirmam seus preconceitos.

Em Decisões Financeiras

Quando golpes financeiros ou esquemas enganosos resultam em perdas, é importante reconhecer tanto o engano quanto as escolhas pessoais. "O vendedor me enganou" pode ser verdade, mas perguntas adicionais são necessárias: "Ignorei sinais de alerta porque estava ganancioso? Tomei decisão precipitada sem devida diligência?" Aprendizado genuíno requer esta honestidade dupla.

Com Ensinos Religiosos Falsos

Se você foi enganado por falso mestre ou doutrina herética, reconheça a responsabilidade do enganador mas também examine suas próprias escolhas. Você estudou as Escrituras por si mesmo? Buscou conselho de crentes maduros? Ou seguiu cegamente porque o ensino era conveniente ou agradável? Discernimento espiritual requer tanto reconhecer engano quanto desenvolver habilidades de discernimento.

Em Vícios e Dependências

Indústrias de álcool, tabaco, jogos e outras frequentemente enganam sobre riscos e natureza viciante de seus produtos. Reconheça este engano corporativo, mas também assuma responsabilidade por escolhas contínuas. "Fui enganado sobre os riscos" explica como começou, mas "continuo escolhendo" explica por que continua. Recuperação requer ambas as verdades.

Com Influências de Mídia Social

Algoritmos de redes sociais são projetados para nos enganar sobre realidade, criando bolhas de filtro e apresentando versões distorcidas da vida. Quando você se sente inadequado comparando-se a imagens curadas, reconheça: "Estou sendo enganado pela natureza artificial destas plataformas, MAS também escolho continuar usando-as desta forma." Tome medidas para uso saudável.

Em Situações de Pecado Sexual

Quando tentação sexual envolve engano sobre consequências ou natureza do ato, reconheça o engano (da cultura, pornografia, ou tentador) mas não use isso como desculpa completa. "Fui enganado sobre o que traria satisfação" é verdade, mas "escolhi acreditar nessa mentira em vez da verdade de Deus" também é verdade. Santidade requer reconhecer ambas as realidades.


8. Perguntas e Respostas Reflexivas sobre o Versículo

1. Como a interação entre Eva e a serpente ilustra a sutileza da tentação em nossas próprias vidas?

A serpente não forçou Eva, mas a enganou através de perguntas que plantaram dúvida ("É assim que Deus disse?"), meias-verdades ("certamente não morrereis"), e promessas atraentes ("sereis como Deus"). Tentação em nossas vidas opera similarmente - raramente vem como comando direto para pecar, mas como questões sutis sobre se Deus realmente tem nossos melhores interesses, como racionalização que minimiza consequências, e como promessas de realização fora da vontade de Deus. Reconhecer estes padrões nos torna mais vigilantes. Quando você se pega pensando "Será que Deus realmente se importa com isso?" ou "Desta vez será diferente", reconheça o padrão da tentação do Éden.

2. De que maneiras podemos garantir que não sejamos enganados por falsos ensinamentos ou ideologias hoje?

Proteção contra engano requer múltiplas camadas: conhecimento profundo das Escrituras (não apenas versículos isolados mas narrativa completa), comunidade de crentes maduros que podem nos corrigir, humildade para admitir quando estamos errados, e Espírito Santo para nos guiar em verdade. Eva tinha palavra direta de Deus mas não a defendeu vigorosamente contra a serpente. Devemos ser capazes de dizer com convicção: "Deus disse isto, e escolho confiar Nele independentemente do que outros argumentem." Também devemos testar tudo contra as Escrituras (Atos 17:11) e buscar conselho de múltiplas fontes confiáveis antes de abraçar novos ensinamentos.

3. Como reconhecer responsabilidade pessoal por nossas ações impacta nosso crescimento espiritual e relacionamento com Deus?

Assumir responsabilidade pessoal, mesmo quando fomos enganados ou influenciados, é essencial para crescimento porque abre porta para arrependimento genuíno e mudança. Enquanto culpamos completamente forças externas, permanecemos presos porque não vemos necessidade de mudança interna. Eva poderia ter dito "A serpente me fez comer", mas reconheceu "eu comi." Este reconhecimento permitiu que Deus lidasse com seu coração, não apenas com circunstâncias externas. Em nosso relacionamento com Deus, Ele já conhece toda verdade; nossa honestidade não O informa, mas transforma a nós. Confissão genuína que assume responsabilidade nos coloca em posição de receber graça transformadora.

4. Que passos podemos tomar para cultivar coração de obediência aos mandamentos de Deus em nossa vida diária?

Cultivo de obediência começa com amor por Deus que nos motiva a agradá-Lo (João 14:15). Passos práticos incluem: estudo regular das Escrituras para conhecer Seus mandamentos, oração pedindo ao Espírito Santo para nos capacitar a obedecer, comunidade de responsabilidade onde outros nos ajudam a permanecer fiéis, prática consistente de obediência em coisas pequenas que constrói músculo espiritual para decisões maiores, e lembrança regular das bênçãos que vêm da obediência e consequências da desobediência. Também devemos identificar áreas específicas de tentação e criar salvaguardas proativas. Obediência não acontece por acidente; requer intencionalidade e dependência de Deus.

5. Como o relato da queda em Gênesis 3:13 pode informar nossa compreensão da necessidade de confissão e arrependimento em nossa jornada espiritual?

Gênesis 3:13 mostra que Deus busca confissão não para humilhar, mas para restaurar. Sua pergunta a Eva foi oportunidade, não armadilha. Quando entendemos isto, confissão se torna menos sobre medo de punição e mais sobre honestidade que abre caminho para cura. A resposta de Eva, embora incluindo explicação sobre engano, ainda reconheceu sua própria ação. Isto nos ensina que confissão genuína pode reconhecer contexto e influências sem usar isto como desculpa. Arrependimento verdadeiro diz: "Fui tentado/influenciado/enganado, E escolhi pecar. Estou errado. Preciso mudar." Esta honestidade completa é o que permite que graça de Deus trabalhe transformação profunda em nós.


9. Conexão com Outros Textos

Gênesis 3:1-12

"Ora, a serpente era mais astuta que todas as aleferas do campo que o Senhor Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?... [todo o diálogo entre serpente e Eva, seguido pelo interrogatório de Adão]"

Fornece contexto para o engano e a conversa inicial entre a serpente e Eva.

2 Coríntios 11:3

"Mas temo que, assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos e se apartem da simplicidade que há em Cristo."

Paulo adverte os coríntios sobre serem desviados, referenciando o engano de Eva como exemplo de advertência.

1 Timóteo 2:14

"E Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão."

Paulo nota que Eva foi enganada, destacando a natureza da queda e suas implicações para a humanidade.

Apocalipse 12:9

"E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o diabo e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele."

Identifica a serpente como Satanás, o enganador de todo o mundo, conectando a queda à batalha espiritual mais ampla.


10. Original Hebraico e Análise

Versículo em Português: "O Senhor Deus perguntou então à mulher: 'Que foi que você fez?' Respondeu a mulher: 'A serpente me enganou, e eu comi'."

Texto Hebraico: וַיֹּ֨אמֶר יְהוָ֧ה אֱלֹהִ֛ים לָֽאִשָּׁ֖ה מַה־זֹּ֣את עָשִׂ֑ית וַתֹּ֙אמֶר֙ הָֽאִשָּׁ֔ה הַנָּחָ֥שׁ הִשִּׁיאַ֖נִי וָאֹכֵֽל

Transliteração: Vayomer YHWH Elohim la'ishah mah-zot asit vatomer ha'ishah hanachash hishi'ani va'okhel

Análise Palavra por Palavra:

וַיֹּ֨אמֶר (Vayomer) - "e disse" Waw consecutivo com verbo "amar" (dizer) no imperfeito. Continua sequência narrativa do interrogatório divino.

יְהוָ֧ה (YHWH) - "Senhor" O nome pessoal de Deus, o tetragrama sagrado. Indica relacionamento de aliança e pessoal.

אֱלֹהִ֛ים (Elohim) - "Deus" Forma plural que indica majestade e poder. Junto com YHWH, enfatiza tanto o aspecto pessoal quanto o poder soberano de Deus.

לָֽאִשָּׁ֖ה (la'ishah) - "à mulher" Preposição "para" + artigo definido + substantivo feminino. Deus agora direciona Sua atenção especificamente à mulher.

מַה־זֹּ֣את (mah-zot) - "que é isto, o que" Pronome interrogativo + pronome demonstrativo feminino. Literalmente "O que é isto?" A forma enfatiza a seriedade da ação.

עָשִׂ֑ית (asit) - "fizeste, você fez" Verbo "asah" (fazer) no perfeito, segunda pessoa feminino singular. Pergunta direta sobre a ação específica de Eva.

וַתֹּ֙אמֶר֙ (vatomer) - "e disse, respondeu" Waw consecutivo com verbo "amar" (dizer) no imperfeito, terceira pessoa feminino singular. Introduz a resposta de Eva.

הָֽאִשָּׁ֔ה (ha'ishah) - "a mulher" Artigo definido + substantivo feminino. Reforça identidade de quem está respondendo.

הַנָּחָ֥שׁ (hanachash) - "a serpente" Artigo definido + substantivo masculino. Esta é primeira vez no interrogatório que a serpente é explicitamente mencionada. O artigo definido indica "A serpente" específica que todos conhecem.

הִשִּׁיאַ֖נִי (hishi'ani) - "me enganou, me iludiu" Verbo "nasha" (enganar, seduzir, iludir) no hifil (causativo) perfeito, terceira pessoa masculino singular + sufixo pronominal primeira pessoa. O hifil intensifica a ação - a serpente ativamente causou o engano. Esta é palavra forte que implica sedução deliberada e manipulação.

וָאֹכֵֽל (va'okhel) - "e eu comi" Waw consecutivo + verbo "akal" (comer) no imperfeito, primeira pessoa singular. Admissão final e direta de sua própria ação.

A estrutura é notavelmente mais concisa que a resposta de Adão. Eva usa apenas quatro palavras em hebraico para sua explicação e confissão, comparado às sete palavras defensivas de Adão. A palavra-chave "hishi'ani" (me enganou) é particularmente significativa - é verbo forte que reconhece manipulação deliberada, não apenas erro de julgamento. Eva está claramente dizendo que foi vítima de engano intencional, mas ainda assim conclui com admissão pessoal: "va'okhel" (e eu comi).


11. Conclusão

Gênesis 3:13 oferece perspectiva crucial sobre a natureza do pecado, tentação e responsabilidade moral que complementa e aprofunda o que vimos no versículo anterior. A resposta de Eva revela tanto a realidade do engano espiritual quanto a impossibilidade de usar esse engano como desculpa completa para nossas escolhas.

A progressão do interrogatório divino - primeiro Adão, depois Eva - demonstra método pedagógico de Deus que lida com cada pessoa individualmente, dando a cada um oportunidade de confissão. Deus não permite que Adão fale por Eva nem que Eva se esconda atrás da resposta de Adão. Cada um deve prestar contas pessoalmente. Este princípio permanece verdadeiro hoje: não podemos esconder-nos atrás de comunidade ou família; cada um enfrenta Deus como indivíduo.

A resposta de Eva introduz dimensão crucial que estava ausente na resposta de Adão: o reconhecimento explícito da serpente como enganadora. Isto prepara caminho para o julgamento da serpente que virá no versículo seguinte e estabelece tema bíblico persistente sobre realidade da guerra espiritual. Não estamos apenas lutando contra nossa própria natureza pecaminosa, mas contra adversário espiritual real que ativamente trabalha para nos enganar.

A tensão entre ser enganado e ser responsável, que Eva demonstra em sua resposta, é tensão que todos vivemos. Somos simultaneamente influenciados por forças externas (Satanás, cultura, outras pessoas) e responsáveis por nossas próprias escolhas. Sabedoria espiritual madura reconhece ambas realidades sem usar uma para anular a outra. Eva foi genuinamente enganada E genuinamente culpada. Estas duas verdades coexistem.

Do ponto de vista pastoral, este versículo oferece modelo para como lidar com pecado em nossas próprias vidas e ao aconselhar outros. Confissão genuína pode e deve reconhecer contexto - tentações, influências, pressões - sem usar essas coisas como desculpas. Dizer "Fui tentado" é honesto; dizer "Fui tentado, então não é minha culpa" é evasão. Eva encontra equilíbrio: reconhece engano mas não nega ação.

A relevância contemporânea é imensa em era de "vitimização" onde pessoas frequentemente se apresentam como completamente sem agência, determinadas inteiramente por forças externas. O modelo bíblico reconhece realidade de influências externas sem negar responsabilidade pessoal. Isto é libertador porque nos capacita - somos agentes morais com poder de escolha, não apenas vítimas passivas de circunstâncias.

Este versículo também alerta sobre natureza do engano espiritual. A serpente não forçou Eva; ela a enganou. Engano é mais perigoso que força porque opera através de nossa própria vontade. Nos leva a escolher mal pensando que escolhemos bem. Vigilância constante e fundamentação nas Escrituras são nossas proteções contra ser enganados como Eva foi.

Finalmente, este versículo aponta para necessidade de redenção que só Cristo pode fornecer. Eva foi enganada e escolheu mal; todos somos enganados e escolhemos mal. Precisamos de salvador que não foi enganado (Jesus enfrentou tentação mas não pecou) e que pode nos libertar tanto do poder enganador de Satanás quanto da culpa de nossas próprias escolhas. A resposta de Eva expõe problema humano fundamental que apenas graça divina pode resolver.

A Bíblia Comentada